É
muito mais do que a graduação em um curso superior: um capítulo na história da
reafirmação indígena no Ceará. Ato pioneiro no Nordeste, 36 professores índios
concluem, pela Universidade Federal do Ceará (UFC), o Curso de Magistério
Indígena Tremembé Superior (Mits), criado por iniciativa dos próprios índios
Tremembé do distrito de Almofala, em Itarema, Zona Norte do Estado. Após seis
anos de uma longa jornada de estudos e etapas para o reconhecimento no Conselho
Nacional de Educação, a licenciatura intercultural abre novo passo no conceito
de educação superior.
A ideia foi dos Tremembé
As
lideranças da aldeia entendiam que por meio da educação que os valores
culturais e sociais seriam transmitidos, ou melhor, mantidos pelas outras
gerações. Mas o professor orientado nos bancos da pedagogia tradicional - com
algumas exceções, carregada de vícios coloniais - não trazia as ferramentas
necessárias para a manutenção dos saberes e fazeres. Foi aí que os índios de
Almofala, com apoio de pesquisadores das próprias universidades, deram início a
formação docente, embora já fossem professores nas escolas diferenciadas. E uma
história muito interessante, foi o único curso no País criado dentro de uma
aldeia indígena, comemora o professor doutor Babi Fonteles, pesquisador e
coordenador acadêmico do curso que acompanha há muitos anos a luta dos povos
indígenas pelo reconhecimento.
Mas o
curso tem uma coordenação ampliada, contemplando representação indígena. Aliás,
o corpo docente é formado, além de doutores da academia, por reconhecidas
lideranças sociais e espirituais indígenas.
O
cacique João Venâncio e o pajé Zé Caboclo, por exemplo, lecionam a disciplina
"Saberes Tremembé do mar, do céu e da terra". São profundos
conhecedores, por vivência, das ciências da natureza, além de grandes
referências dentro da aldeia. O mestre Zé Biinha da disciplina de Artesanato
Indígena, Agostinho Tucum trata da História Tremembé. Outros professores são
pesquisadores da Universidade Federal do Ceará, da estadual (Uece) e da
Universidade Vale do Acaraú (Uva). As aulas tiveram início em 2006, e no ano de
2008, vencendo 12 de 49 etapas, o curso tem recurso para custeio
disponibilizado pelo Programa de Apoio a Licenciatura Indígena, do MEC. O
magistério Tremembé havia entrado no edital, concorrendo com outros do Pais,
sendo aprovado em terceiro lugar. Em seguida, o outro passo foi a formalização
do curso no Programa de Graduação da UFC, garantindo, assim, a colação de grau
de 36 formandos no mês de marco.
Mercado
Para
onde irão os 36 graduados? Para onde nunca quiseram sair. Isso porque a
proposta desse magistério não é absorção em mercados, mas garantia de mais
conhecimento (o que, teoricamente, deveria ser o primordial de qualquer curso
superior) na transmissão do saber nos aldeamentos indígenas. Formar lideranças
no âmbito da escola para fortalecer o movimento indígena. "A primeira
coisa a se entender é que em educação diferenciada indígena não se fala em
mercado. Uma das razões e o critério para a seleção dos candidatos: o primeiro
é ser índio Tremembé, o segundo já atuar em uma das seis escolas das
localidades indígenas, e o terceiro critério é ter o nome aprovado pelo
conjunto da comunidade. Como se vê, é um vestibular mais difícil que o
Enem", compara Fonteles.
A
colação de grau se dará na Concha Acústica da UFC, em Fortaleza, no dia 6 de
marco. Os 36 índios professores receberão o diploma 40 anos após uma
apresentação cultural de seus ancestrais naquele mesmo espaço, quando menos se
sabia de onde estavam e quem eram os índios do Ceará.
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