quinta-feira, 21 de julho de 2011

Carteira Indígena realiza capacitação com os Tremembé de Queimadas e Telhas


Entre os dias 16 e 19 de julho, representantes da Carteira Indígena/MMA e do Comitê Gestor do programa estiveram nas aldeias Tremembé de Queimadas e Telhas, no município de Acaraú, para realizar a capacitação com as lideranças locais sobre a gestão e prestação de contas dos projetos aprovados pelas referidas aldeias no primeiro edital da Carteira Indígena direcionado para mulheres indígenas.
O técnico Luiz Gustavo, do MMA, e Ceiça Pitaguary, representante da APOINME e membro do Comitê Gestor da CI, realizaram as capacitações em Queimadas nos dias 16 e 17 e em Telhas, 18 e 19 do mês corrente.
O objetivo da capacitação é preparar as mulheres e lideranças locais para executarem o projeto em todas as suas etapas, inclusive na gestão dos recursos e na prestação de contas. Para isso, os indígenas contarão com o Manual de Prestação de Contas elaborado pela CI com o intuito de orientar todos os passos da comunidade executora do projeto.
Gustavo falando sobre a Carteira Indígena em Queimadas
Indígenas de Queimadas atentos às explicações
Uma das questões mais enfatizadas pela equipe foi o fato de que dos 165 projetos recebidos pela Carteira durante o período de inscrição, apenas 20 conseguiram ser aprovados e no Ceará somente os 02 projetos Tremembé foram contempladas no certame. Diante dos dados, Gustavo e Ceiça parabenizaram as comunidades pela conquista.
Momento de realização do Marco Zero
Em ambos os projetos, as mulheres serão contempladas com Cozinhas Comunitárias, construídas em parceira com a FUNAI e a prefeitura de Acaraú. O objetivo do fortalecimento das cozinhas é o beneficiamento e a produção de alimentos para o Programa de Aquisição de Alimentos – PAA e o Programa Nacional da Alimentação Escolar – PNAE.
A preocupação com a sustentabilidade econômica e ambiental foi um critério importante para a aprovação dos projetos. Em Queimadas, os indígenas estão investindo na produção de alimentos de base agroecológica e uma das metas do projeto é o plantio de 10 mil mudas de espécies frutíferas, aromáticas, madeireiras e medicinais, que além de produzir alimento para ser beneficiado nas cozinhas, também serão responsáveis pela recomposição da mata nativa, recuperando a biodiversidade parcialmente destruída durante o conflito com o DNOCS.
Já em Telhas, o fortalecimento do artesanato foi um dos principais anseios das mulheres indígenas que terão com o projeto, além das capacitações, todos os equipamentos necessários para montar um espaço coletivo de produção de artesanato.
Capacitação em Telhas
Ceiça esclarecendo algumas questões do projeto em Telhas
O fortalecimento político e institucional das duas aldeias também recebeu atenção dos técnicos na hora da elaboração do projeto. Os Conselhos Indígenas serão mobiliados (com computador, impressora, mesa, cadeira, armário, etc.), de modo que as lideranças terão um espaço mais equipado para reunião e discussão das questões internas, bem como para elaborarem seus próprios documentos.
Os dois projetos também dispõem de recursos para realizar visitas de intercâmbio para trocas de experiências, viagens para apresentação e comercialização dos produtos, participação em feiras e eventos indígenas, como a Assembléia dos Povos Indígenas do Ceará, que esse ano será realizado no município de São Benedito.
Além das ações citadas acima, as duas comunidades contarão com assistência técnica para auxiliá-los em todas as etapas dos projetos.
Os trabalhos da equipe da Carteira Indígena foram finalizados em Telhas com a apresentação do Torém em comemoração pela aprovação dos projetos e com um almoço servido pelas mulheres.
Presidente do Conselho Indígena André Sales e o comitê gestor de mulheres no momento da assinatura do Acordo de Subvenção


segunda-feira, 11 de julho de 2011

Quintais Produtivos: os primeiros resultados na aldeia Queimadas

Antes de falar sobre o tema desta postagem, gostaria de contar uma historinha, só a título de contextualização...
Pouco tempo antes de ser convidado para trabalhar com os índios Tremembé de Queimadas e Telhas conheci uma propriedade cujo agricultor trabalhava seguindo os princípios da Agroecologia. Enquanto caminhávamos pelo sítio, ele contava que antes de aprender a manejar a terra a partir dos princípios da agricultura ecológica, havia realizado grande estrago nos recursos naturais disponíveis na terra. Somente ao chegar a esta constatação, é que ele passou a ter um outro olhar sobre a terra, o meio ambiente, o trabalho... sobre sua vida!
Até então eu não me ligava muito nestas questões, mas quando cheguei em Queimadas, no fim de julho de 2009, tinha certeza de que seria através desse caminho alternativo de desenvolvimento local, cujas questões produtivas estão intimamente ligadas as preocupações ambientais e culturais, que as aldeias Tremembé conseguiriam superar as dificuldades existentes ali.
O primeiro desafio a enfrentar era produzir alimentos para suprir as necessidades das famílias para depois pensar em mecanismos de geração de renda. Nesta época, nas Queimadas, não havia ainda a prática de plantar outras culturas além da tríade: feijão, milho e roça. Já existiam abundantes cajueiros, mas só isso. Era a partir desses quatro itens que as famílias retiravam uma parte de seu sustento. A outra vinha dos programas assistenciais como Bolsa Família e de cestas básicas enviadas pela FUNAI e eventualmente doadas pela prefeitura.
A maioria dos homens trabalhava nos lotes do Perímetro Irrigado; ganhavam pouco e ainda estavam submetidos aos riscos de agrotóxicos e fertilizantes químicos. Tinham terra, mas trabalhavam na terra alheia; enriquecendo outros e empobrecendo a própria saúde!
Foi aí então que com a ajuda do Tiago, que através da filha do prefeito, consegui trazer para trabalhar conosco e iniciamos um projeto pequeno, modesto, sem recursos, onde propomos às famílias a criação de quintais produtivos.
Os Quintais Produtivos são sistemas que integram vários subsistemas, como jardim, hortas, plantas medicinais e a criação de pequenos animais, complementados com a compostagem e adubação orgânica. Para iniciar um quintal produtivo deve ser feita inicialmente uma leitura do espaço e de suas possibilidades de uso, com identificação das plantas úteis já presentes, das ervas nativas e dos animais que podem ser criados, do solo e da água disponíveis.
As possibilidades de combinar as várias espécies são infinitas e dependem do gosto e das necessidades de cada família, como plantas para enriquecer o sabor e o valor nutritivo dos alimentos, raízes, tubérculos, fruteiras, ervas medicinais, plantas ornamentais ou com outras utilidades. O resultado de um quintal diversificado é o aumento da produção de oxigênio, da absorção de carbono e também a conservação e perpetuação das plantas nativas. No seu conjunto, as plantas filtram a poluição, absorvem ruídos, diminuem a intensidade dos ventos, alimentam e abrigam os animais e regularizam a temperatura e a umidade. Adicionalmente o quintal produtivo gera uma sensação de bem-estar para a família ao tornar-se um local de convivência.[1]
O quintal produtivo era o primeiro passo para uma transição agroecológica!
Organizamos um curso de Agroecologia, levamos as famílias das duas aldeias para conhecer experiências que deram certo, organizamos aulas de campo e produzimos mudas. Agora era a hora de ver quem realmente se interessaria. Inicialmente um grupo de 08 famílias se interessaram pela proposta dos quintais.
E os resultados começaram a aparecer. De um local onde praticamente não se produzia nada além dos alimentos que citei acima, os indígenas passaram a produzir hortaliças que, além de suprir uma carência nutricional das famílias, passou a ser comercializada e garantir renda com algo produzido na própria aldeia. Segue abaixo algumas fotos que ilustram esses resultados.

Alface: Luciano e Evaldo fazendo a coleta para comercialização

Batata doce: plantio em meio às bananeiras e cajueiros
Berinjela
Cebolinha
Coentro
None
Pimenta de Cheiro
Pimentão (frente) e Tomate (atrás)
Urucum

           Além dos cultivos acima, os índios de Queimadas ainda produzem Couve Manteiga e iniciou um plantio experimental de Cenoura, Beterraba. Os indígenas agroecologistas também plantam e cultivam ervas aromáticas e medicinais como manjericão, anador e meracilina. 

             Mas a apropriação dos conceitos e práticas agroecológicas fez com que os índios fossem mais adiante, dando mais um passo na transição para uma agricultura ecológica. A necessidade de reflorestar e recompor a mata nativa, destruída durante o conflito com o DNOCS, e as possibilidades advindas de um manejo sustentável através do consórcio de espécies frutíferas, medicinais e lenhosas foram fatores que estimularam as famílias a dar mais um passo: a implantação de Sistemas Agroflorestais. Mas isso fica para o próximo post. 



[1] Cartilha Agroecologia colocada em prática. Fortaleza: Fundação Conrad Adenauer, 2006. disponível no Portal Agroecologia.