sábado, 26 de julho de 2014

Adeus a Grosso Tremembé


Fonte: www.conexaonet.dihitt.com/

Os últimos dias foram de tristeza, mas também de alivio para a família da liderança indígena Manoel Félix do Nascimento, mais conhecido como Grosso Tremembé, falecido ontem, sexta-feira, após meses de luta contra um câncer. Após se submeter a várias sessões de quimioterapia, Grosso apresentou alguma melhora, mas nos últimos 15 dias seu quadro se agravou e foi liberado pelos médicos, já que sua situação não apresentava alternativas.
Eleito vereador pelo município de Itarema em 2012, Grosso Tremembé logo se destacou por sua atuação política e pelo carisma, despertando a admiração e o carinho não somente dos Tremembé, mas também da população do município. Em visita a Almofala, durante o período que lutava pela vida, pude constatar pessoalmente manifestações de solidariedade e de preocupação de vários moradores de Almofala. Nos últimos dias, a casa da família foi visitada por centenas de pessoas, desde parentes indígenas, moradores de várias localidades, até políticos locais.
Início do cortejo
Foto: Ronaldo Santiago

Cortejo até o cemitério
Foto: Ronaldo Santiago
Sepultamento
Foto: Ronaldo Santiago
Despedida
Foto: Ronaldo Santiago

Seu sepultamento ocorreu neste sábado, 26/07, no cemitério da comunidade da Varjota, local onde nasceu e viveu durante toda a sua vida. Centenas de pessoas, algumas delas visivelmente emocionadas, acompanharam o cortejo até o cemitério.
Nos solidarizamos com a dor da família, em especial, seu pai, o pajé Luis Caboclo, que com uma força indescritível e com resignação, acompanhou todos os detalhes do sepultamento do filho.
Como uma singela homenagem, transcrevemos abaixo alguns depoimentos de parentes e amigos que expressaram a dor pela perda e manifestaram seu carinho e admiração pelo amigo.

“Esse foi e vai ser sempre um grande homem, guerreiro, prestativo, humano, pessoa super do bem... Você fez historia, primeiro vereador indigena Tremembé, foi com muito esforço que conseguimos essa grande conquista. Com certeza você vai ser sempre lembrado como um grande vencedor! Hoje foi seu ultimo dia conosco em matéria, mas em nossos corações você vai permanecer eternamente”.
Lucinha Tremembé, agente de saúde e liderança Tremembé da Passagem Rasa 

"Amigos,
Com pesar, conformação e esperança, comunico a passagem do nosso amigo professor Manuel Félix do Nascimento, o "Grosso", filho do pajé Luis Caboco, neste dia, às 11h00, em sua casa, na comunidade tremembé de Varjota, Itarema/CE.
Ele foi um brilhante aluno do Curso de Magistério Indígena Tremembé Superior - MITS, destacando-se no estudo e no ensino da Matemática às crianças e jovens indígenas.
Foi presidente do Conselho Tutelar de Itarema e o primeiro vereador indígena da história do Ceará.
Era uma pessoa bem humorada, inteligente, amiga, solidária.
Grosso lutou bravamente contra um câncer. Nunca se entregou à doença, nem se intimidou diante da morte. Um exemplo de luta e solidariedade. Se fez querido unicamente por suas virtudes.
Sua partida, tão precoce, nos deixa um pouco tristes, mas também fortalece em todos nós, amigos do seu Povo, a certeza de que os Tremembé são uma gente guerreira, como eles mesmos dizem: "Nós brandeia, mas não arreia".
Um grande exemplo para todos. Até breve, amigo!"
Babi Fonteles, professor da UFC e coordenador do Magistério Superior Tremembé - MITS

“Vi meu bom amigo ser enterrado na areia, atras de sua casa. No mesmo solo em que nasceu, brincou, cresceu, trabalhou e viveu. Respeitando suas crenças e valores, foi enterrado sem esquife. Sem barreiras entre seu corpo e a terra que o alimentou.
Cavaram fundo a areia, como se pudéssemos enterrar junto com o seu corpo, a dor que a sua ausência impõem.
Grosso Tremembé me ensinou muitas coisas... Me ensinou a ter esperança, mesmo quando tudo diz o contrário.
Me ensinou que o respeito é maior que a aceitação.
Me ensinou que a força não depende do quanto você pode carregar, mas sim do quanto você pode compartilhar.
O pouco é muito.
Alguns consideraram o meu trabalho um esforço, mas acompanhá-lo em seu martírio foi um privilégio...
Agradeço a sua família por me cederem uma rede em sua varanda, sua tapioca e o peixe assado que me alimentaram durante estes quinze dias em que pude viver intensamente a dor e a luta deste nobre amigo.
Obrigado meu irmão.
Obrigado por me mostrar que a nossa força pode ser o que nos fragiliza, mas também é o que nos faz únicos, uns na vida dos outros”.
Rafael Sacramento, médico da equipe de saúde indígena Tremembé